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Jornada épica de mamute que viveu há 17 mil anos é reconstituída

Esqueleto de mamute exposto em museu. Animal foi extinto há cerca de 10 mil anos. Foto: Pixabay

Um mamute que viveu no Alasca há cerca de 17.000 anos viajou tão longe que, se andasse em linha reta, teria dado a volta ao mundo inteiro – quase duas vezes. Uma análise recente da presa resguardada do animal onipresente da era do gelo (ou período glacial) revelou que, em 28 anos, ele caminhou quase 80.500 quilômetros.

Para refazer os passos do mamute-lanoso adulto, os pesquisadores fizeram algo que nunca havia sido feito antes: eles cortaram uma presa de mamute ao longo de seu comprimento, investigando a química das camadas que se acumulavam na presa ano após ano durante a vida do animal.

Em seguida, eles compararam esses dados com assinaturas químicas em locais em todo o Alasca, que foram identificados a partir dos dentes de pequenos mamíferos da era do gelo. Combinando proporções de elementos químicos em diferentes partes da presa, com proporções semelhantes de dentes de pequenos mamíferos, os cientistas foram capazes de criar um mapa regional que mostrou onde o mamute vivia ano após ano.

Em mamutes-lanosos (Mammuthus primigenius) – também chamados mamutes-lanudos – e seus parentes elefantinos (vivos e extintos), as presas preservam informações sobre seus habitats em um elemento chamado estrôncio, que as presas absorvem das plantas que os animais comem.

Os mamutes foram extintos há cerca de 10 mil anos. Animais mamíferos da família Elephantidae, a mesma dos atuais elefantes, chegavam a ter quatro metros de altura, e viveram na América do Norte, Europa e Ásia.

As proporções de isótopos de estrôncio – versões do elemento com diferentes números de nêutrons – variam entre as localizações geográficas. Em um novo estudo, os pesquisadores relataram que, registros incrementais das proporções de isótopos locais em presas, podem revelar onde os animais estavam comendo durante diferentes estágios de suas vidas.

Reconstrução de um exemplar de mamute-lanoso que está no Museu Real da Columbia Britânica.
Foto: Wikimedia Commons

No entanto, a maioria das análises anteriores de presas de mamute baseava-se em pequenos núcleos perfurados verticalmente a partir das presas. Esses núcleos revelam algumas das camadas de presas. “Mas você não está obtendo o registro completo”, disse o principal autor do estudo, Matthew Wooller, diretor do Alaska Stable Isotope Facility e do Water and Environmental Research Center, da University of Alaska Fairbanks (UAF).

Na base das presas de um mamute estão cavidades em forma de cone. Elas são revestidas por camadas de esmalte, que se assemelham a cones de sorvete invertidos, segundo Wooller.

“Novas camadas revestem essa cavidade todos os dias e, ao longo dos anos e décadas, as presas crescem à medida que novas camadas se acumulam na parte inferior, da mesma forma que uma torre de cones de sorvete fica mais alta se você inserir novos cones na extremidade aberta da pilha. Ler o registro da vida de um mamute desde a infância até a morte exigia, portanto, dividir uma presa no sentido do comprimento, de modo que todas as camadas internas de “casquinha de sorvete” ficassem expostas para amostragem, explicou Wooller.

Seis cientistas para dividir a presa

Para o estudo, os cientistas usaram uma das presas de um mamute adulto da coleção do Museu da Universidade do Alasca. A peça foi coletada na Planície Costeira Ártica do Alasca, acima do Círculo Polar Ártico, em 2010. A análise de DNA revelou que o mamute era do sexo masculino. Ele viveu cerca de 17.000 anos atrás e sua presa media 2,4 metros de comprimento.

Uma visão de uma presa de mamute que foi dividida pelos cientistas. Foto: Reprodução

Descobrir como dividir a enorme presa em espiral, de maneira uniforme (e sem danificá-la), levou cerca de um ano. Já dividi-la exigiu o esforço de seis cientistas, uma enorme serra e quase um dia inteiro de corte meticuloso. “Podemos ter quebrado uma lâmina ou duas no caminho”, disse Wooller.

Depois de dividir a presa, os cientistas coletaram cerca de 400.000 pontos de dados individuais sobre as concentrações de estrôncio e outros isótopos, como oxigênio e nitrogênio, retirados do centro da “linha do tempo” preservada, cobrindo toda a vida do animal. A ponta da presa representava o mamute como um bebê e jovem, e a sua base mostrava os últimos anos de vida do animal.

Para saber onde, exatamente, o mamute estava caminhando, os autores do estudo compararam seus dados a um mapa dos mesmos isótopos para os habitats árticos do mamute, preservados nos dentes de minúsculos roedores herbívoros da época do Pleistoceno (2,6 milhões a cerca de 11.700 anos atrás). Como pequenos roedores como musaranhos (animais parecidos com camundongos) e ratazanas permanecem em habitats muito localizados ao longo de suas vidas, os dados regionais poderiam então ser usados ​​para identificar locais onde o mamute viveu ou visitou.

Os cientistas então geraram “caminhadas” gigantescas que abrangeram 28 anos e continham 1.133 pontos de dados, chamados de “etapas”, com 40 etapas representando aproximadamente um ano de vida.

Passo a passo

Quando bebê, o mamute viveu principalmente na bacia do rio Yukon. Durante a juventude, o animal se mudou para as planícies do interior do Alasca, provavelmente viajando com um rebanho, onde permaneceu até os 15 anos de idade. O alcance do mamute aumentou quando atingiu a maturidade sexual aos 15 anos e deixou o rebanho, assim como os elefantes machos jovens também fazem, de acordo com o estudo.

E então, durante seus últimos dois anos de vida, o mamute ficou em altitudes mais elevadas, no extremo oeste da cordilheira Brooks, no Alasca. Um pico nos isótopos de nitrogênio antes da morte do animal indicava um período de fome, talvez por causa de um inverno excepcionalmente rigoroso, relataram os pesquisadores.

“Até este ponto, não tínhamos esse nível de detalhe sobre os padrões de movimento dos mamutes”, disse Wooller. “Estudos futuros de outras presas de mamute podem fornecer ainda mais detalhes sobre suas viagens, incluindo como seu comportamento de migração pode ter mudado conforme a última era glacial diminuiu e o clima da Terra se tornou mais úmido e quente. Um desafio que grandes animais no Alasca estão enfrentando agora”, acrescentou.

“A megafauna que vive no Ártico atualmente está enfrentando mudanças climáticas muito substanciais e significativas”, disse o cientista. “Acho que isso mostra as preocupações de como todos esses animais vão adaptar seu comportamento em resposta às mudanças sem precedentes que estamos vendo no Ártico hoje.”

As descobertas foram publicadas em 12 de agosto na revista “Science“.

MB com informações do Live Science