Se você mora principalmente em uma grande metrópole, provavelmente já avistou, em um rio ou canal de águas poluídas, garças em meio à toda sujeira. Na maioria do tempo, elas ficam ali paradas, solitárias ou em pequenos grupos, à espreita que algum peixinho dê sinal de vida e lhes sirva de refeição. Mas, como essas aves desengonçadas, de bico longo, penas brancas e aparentemente tão delicadas, conseguem achar alimento e sobreviver em condições tão precárias?
“Desde que eu era criança, quando eu passava de carro com meus pais pela Avenida Francisco Bicalho, na Leopoldina, onde há um canal até hoje muito poluído e com cheiro forte de esgoto, mas sempre com a presença de garças por lá, eu ficava pensando em como essas aves conseguiam pescar alguma coisa para comer naquela imundície”, comenta o fotógrafo Fábio Arruda, 43 anos, se referindo ao canal do Mangue, localizado na zona central do Rio de Janeiro, que deságua na Baía de Guanabara.
“É algo fantástico e triste ao mesmo tempo, pois é um animal lutando pela sobrevivência em meio ao esgoto, porque seu habitat está degradado por culpa do homem. E o pior: o tempo passa e a poluição só aumenta”, constata.
Comportamento generalista
O biólogo Censo Sanchez explica que a resistência surpreendente da garça-branca (Egretta thula) deve-se ao seu comportamento generalista. Trata-se também de uma espécie de grande adaptabilidade, inclusive em áreas degradadas, como rios poluídos. Quer outro exemplo? O Rio Tietê, em São Paulo, que, apesar das condições extremas e águas fétidas, conta sempre com a presença de bandos de garças por todo o seu curso – e também de jacarés e capivaras, outros animais ‘heróis da resistência’.
“As garças têm um comportamento muito generalista, se alimentam de pequenos peixes e pequenos crustáceos, em águas mais rasas que elas podem pescar. Com a destruição do habitat natural delas, só tem sobrado esses espaços. Elas conseguem resistir a esses locais, mesmo não tendo muito alimento, porque é o que sobrou para elas e elas se adaptaram”, conta Celso, que é professor da UNIRIO (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro).
No canal do Mangue, por exemplo, o biólogo observa que as aves param ali para dar uma pausa, mas dificilmente conseguem alimento. No entanto, o canal é próximo da Quinta da Boa Vista, local muito arborizado, onde elas também encontram abrigo e condições mais favoráveis.
“Já na Baía de Guanabara, em alguns trechos, ainda encontra-se algumas espécies de peixes, como os barrigudinhos, entre outros, aí elas conseguem uma maior sobrevivência, assim como na Lagoa Rodrigues de Freitas (zona sul carioca)”, complementa Celso Sanchez.
A natureza é mesmo incível, não é?
FICHA TÉCNICA – GARÇA-BRANCA
Nome científico: Egretta thula
HABITAT: Borda de lagos, rios e banhados à beira-mar, água doce ou salobra.
TAMANHO: 48 cm de altura, em média.
ALIMENTAÇÃO: Peixes e invertebrados aquáticos.
REPRODUÇÃO: O casal constrói um ninho de galhos secos sobre uma árvore próxima à água. No ninho são postos, com dois ou três dias de intervalo, de três a sete ovos. O casal incuba os ovos de 25 a 26 dias.
HÁBITOS. Corre nas margens de rios e cursos de água atrás de cardumes. Para atrair as presas, move um dos pés sobre a água. O pescoço longo e flexível funciona como uma mola na captura de alimento.
TEMPO DE VIDA: Até 50 anos.