Dois gatos, de tutores do Recife e de Moreno, na região metropolitana do Recife (RMR), foram os primeiros animais domésticos a testarem positivo para o novo coronavírus (Sars-CoV-2) em Pernambuco.
A identificação foi possível através do Projeto Pet Covid-19, que está sendo realizado por professores e estudantes do Departamento de Medicina Veterinária da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE).
O grupo integra um estudo multicêntrico ao lado de outras cinco universidades do Brasil – as Federais do Paraná, de Minas Gerais, do Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul, além da Universidade Santo Amaro, de São Paulo – cujo o intuito é realizar uma vigilância do novo coronavírus em animais de companhia.
Em alguns estados, o estudo foi iniciado em outubro do ano passado. Na UFRPE, a pesquisa começou em dezembro e, até o momento, foram coletadas amostras de 20 animais domésticos de tutores diagnosticados com a Covid-19.
O estudo não tem um prazo específico de tempo para ser concluído. A meta é atingir um total de 100 pets testados por universidade participante para que haja um grupo significativo para análises.
Outros nove casos positivos no Brasil
Além das duas notificações feitas pela UFRPE, foram identificados, até agora, outros nove casos positivos no Brasil, sendo quatro em Curitiba (PR), dois em Belo Horizonte (MF), dois em Campo Grande (MS) e um em Cuiabá (MT).
A equipe da UFRPE está recrutando tutores e pets voluntários para a pesquisa. Para participar, o tutor deve morar na RMR, ter testado positivo para o Sars-CoV-2 e estar ainda em período de isolamento, preferencialmente nos primeiros sete dias de sintomas, quando há maior transmissibilidade.
Os interessados em contribuir com a pesquisa devem enviar e-mail para o endereço [email protected] ou entrar em contato pelo Instagram, no perfil @pet.covid19.
É marcada, então, uma visita da equipe do projeto à residência do tutor para a realização da coleta no animal de estimação. No primeiro momento, é realizado o teste molecular, que identifica a presença do vírus no organismo, através de coleta com swab na garganta e no reto, e ainda um exame de sangue.
“Também é feito um questionário para entender como é a rotina do tutor e do animal. Se é um animal que vai à rua, se dorme com o tutor, todos esses detalhes”, explica o professor do Departamento de Medicina Veterinária da UFRPE, Daniel Brandespim, que coordena o projeto no Recife ao lado de Rita Maia, que também leciona na instituição.
Esse questionário é importante para entender como pode ter ocorrido a infecção. No caso dos dois gatos que testaram positivo em Pernambuco, ambos vivem em residências teladas, sem acesso livre à rua, e costumam dormir junto com as tutoras, que também dão beijos neles.
Coincidentemente, os dois felinos são pets de médicas veterinárias. Eles não apresentaram sintomas de doença e estão bem de saúde, segundo Brandespim. Após 15 dias da primeira visita, a equipe retorna à residência dos voluntários para coletar apenas o sangue do animal, no objetivo de investigar a produção de anticorpos.
Todas as amostras são acondicionadas pela UFRPE e enviadas à Tecnologia em Sanidade Animal (Tecsa), laboratório parceiro do projeto, localizado em Belo Horizonte, para processamento e análise.
A partir do momento em que um exame tem resultado positivo, o caso é reportado ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), que, por sua vez, tem a incumbência de notificar a Organização Mundial de Saúde Animal (OIE).
Estudos com animais
A OIE reúne dados de todos os estudos realizados com animais no mundo. Em uma tabela, o órgão lista se a pesquisa é apoiada em casos de infecção natural, como o Projeto Pet Covid-19, ou infecção experimental em laboratório. Lista ainda suscetibilidade de cada espécie à infecção pelo Sars-CoV, a presença de sintomas e a capacidade de transmitir o vírus.
Segundo a OIE, cães e gatos domésticos são alvos de pesquisas mundo afora tanto com infecções naturais quanto experimentais. Na tabela da suscetibilidade à infecção, que tem cinco níveis, os caninos aparecem no terceiro nível, denominado low (baixo), enquanto os bichanos estão no quinto, chamado high (alto). A OIE diz que foram identificados sintomas (como coriza, prostração e espirros) em cães e em gatos, mas não em todos os animais infectados.
Já sobre a possibilidade de transmitirem o Sars-CoV-2, a OIE diz que gatos podem transmitir para outros gatos e que não há registros de transmissão entre cães.
É importante ressaltar que nenhuma pesquisa aponta a possibilidade de infecção de humanos a partir de cães ou gatos. “O vilão, no caso, é o ser humano. É sempre fundamental frisar isso, para evitar casos de abandono por falta ou má informação”, alerta Brandespim.
“É interessante que os animais sejam mantidos distantes de pessoas positivas para o novo coronavírus e que os tutores façam a higiene correta deles ao retornarem da rua, por exemplo. Mas não se deve usar álcool, porque é abrasivo e pode causar lesões. Tem que ser com produtos específicos”, adverte ele.
O Projeto Pet Covid-19 é financiado pelo Centro Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que destinou R$ 700 mil para os estudos.
Após encerrada essa fase de coleta de material biológico dos voluntários e feito o levantamento dos casos positivos, dos ambientes em que vivem, entre outras especificidades, a ideia, segundo Brandespim, é realizar o sequencimaneto genético das amostras que tiveram resultado positivo.
“Tem duas universidades dos Estados Unidos que trabalham muito com sequenciamento e tem também a parceria com a Fiocruz. A ideia é saber se é a mesma linhagem que atinge os humanos. Têm coronavírus específicos que acometem cães e gatos e trazem outros sintomas, como a diarreia, por exemplo. Não têm a mesma patogenicidade do Sars-CoV-2. Então vamos buscar entender se ele pode sofrer uma adaptação (no organismo dos cães e gatos), se tornar um vírus mais enfraquecido.”
Fonte: Folha de Pernambuco