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Pesquisadores portugueses capturaram animais do fundo do oceano para um desafio difícil: mantê-los vivos

Um dos crustáceos coletados do fundo do mar. Foto: HiperSea/Reprodução

Foi entre os cânions de Setúbal e de Lisboa, vales profundos no fundo do mar que ficam ao largo do Cabo Espichel, na costa da Arrábida, em Portugal, que um grupo de pesquisadores portugueses passou 10 dias trabalhando com os animais marinhos de profundidade.

A partir dos 200 metros abaixo da superfície, “quando começa o mar escuro”, até cerca de 1000 metros de profundidade, vivem os chamados animais mesopelágicos, “na sua maioria pequenos crustáceos avermelhados, pequenos camarões com alguns centímetros, muitos peixes que só agora começam a ser conhecidos”, explica Antonina dos Santos, coordenadora da missão e pesquisadora do IPMA – Instituto Português do Mar e da Atmosfera e do CIIMAR – Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental.

“Essa camada de animais mesopelágicos, que vivem todos em conjunto, vê-se nas sondas dos navios. São animais que flutuam na coluna de água e fazem migrações diárias: durante a noite estão a 600 ou 700 metros de profundidade e durante o dia ficam mais perto da superfície, até aos 200 metros.”

Outro alvo do projeto eram os animais que vivem no fundo do mar, a grandes profundidades, e que “são animais móveis”, como por exemplo “peixes, caranguejos, pequenos tubarões, camarões vermelhos”. “Em profundidade o mundo é muito mais solitário. Há animais predadores e animais que comem os detritos que caem de mais acima.”

Entre 23 de abril e 2 de maio, a coordenadora da missão passou dias e noites no navio Mário Ruivo, juntamente com uma equipe técnica e científica que somou 14 pessoas, algumas das quais iam se revezando.

“O nosso objetivo era estudar melhor esses dois grupos de animais, capturá-los e mantê-los vivos, simulando as condições do fundo do mar”, destaca a pesquisadora. O estudo dos animais marinhos de profundidade pode trazer novas oportunidades, por exemplo, para a engenharia biomolecular e a indústria farmacêutica.

Luzes que atraem

Ao longo dos 10 dias, foi testada pela primeira vez uma câmara hiperbárica com o objetivo de atrair e capturar essas espécies, desenvolvida no âmbito do projeto para aguentar as diferenças de pressão atmosférica – muito mais elevadas no fundo do oceano – e temperaturas muito baixas ou muito altas, no caso de vulcões ativos ou fontes hidrotermais.

“Como não há luz nessas profundidades, quase todos os organismos que aí vivem têm bioluminescência, e é dessa forma que atraem outros para se reproduzirem”, explica Antonina dos Santos. Foi usada uma rede mesopelágica construída com materiais fluorescentes para tentar atrair e capturar os animais mesopelágicos e a câmara hiperbárica tinha uma luz acesa no interior, que piscava. O próprio equipamento de filmagem, concebido para esta missão, tinha luzes e raios infravermelhos.

“São animais frágeis e trazê-los para a superfície coloca-os em risco, porque aqui na superfície terrestre a pressão atmosférica é muito leve para eles. O objetivo era capturá-los à mesma pressão e trazê-los na câmara hiperbárica fechada, passando-os depois para outra câmara hiperbárica que servia como aquário, quando chegavam à superfície.”

Durante a campanha, a equipe conseguiu fazer dois mergulhos quase todos os dias. Mas, o peso e as dificuldades de manobra da câmara hiperbárica dentro do navio, que tinha de ser transportada por mar para seguir de uma ponta da embarcação para a outra, dificultavam e prolongavam as tarefas. “São coisas que iremos melhorar”, diz a pesquisadora. Quanto à rede mesopelágica também vai ser modificada, uma vez que desta vez, apesar de várias tentativas, não chegou a capturar nada.

Pequenos crustáceos

Já no fundo do mar, o desfecho foi outro. “Em diferentes mergulhos coletávamos cerca de quatro animais, pequenos crustáceos”, lembra a coordenadora da missão. “Mas só se mantiveram vivos durante cerca de 24 horas”. O problema? A eletricidade do navio teve picos de tensão que danificaram o sistema de manutenção da temperatura na câmara-aquário, ainda para mais em dias de muito calor”, explica.

Ainda assim, Antonina dos Santos considera que a missão teve “muito sucesso” e recorda que “foram até aos 906 metros de profundidade para verificar se o sistema continuava a funcionar” – o que aconteceu com efeito. Vários países do mundo, como os Estados Unidos, França e Japão, também estão desenvolvendo projetos para estudar os animais marinhos de profundidade, cada um à sua maneira.

Além de cientistas do IPMA e do CIIMAR, faziam também parte da equipe do projeto pesquisadores do INESC TEC – Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência, do ISEP – Instituto Superior de Engenharia do Porto e da empresa A. Silva Matos Metalomecânica, especializada na construção de contentores de alta pressão.

Entretanto, a equipe já está pensando em uma segunda fase para a qual será preciso mais financiamento. “Queremos montar um sistema que permita um aquário hiperbárico em um laboratório, que sirva toda a comunidade científica. O que podemos aprender com isso é imenso”, sublinha a pesquisadora.

Fonte: Wilder